sábado, 30 de maio de 2020

COVID 19 e a busca por milagres - tarefas para a Teologia e os Estudos da Religião em África


- As respostas ao COVID 19 são a ciência e as tecnologias da saúde… mas as maiorias pobres em Angola e no Mundo recebem somente migalhas de ciência e de saúde. Os estudos da religião e a teologia precisam ir além do binário ciência X magia para se aproximar de um fenômeno complexo e cotidiano: a busca pelo milagre! 
Alguém já disse que:
"A exigência de que se abandonem as ilusões sobre uma determinada situação, é a exigência de que se supere a situação que necessita de ilusões."

São 3 grandes desafios: 1- entender a busca por milagres como dor e desespero; 2- ao mesmo tempo confrontar agentes religiosos que se aproveitam dessa busca e 3- contribuir com uma pastoral libertadora na criação de coletividades de fé e de direitos.

“E é ao invisível que a linguagem religiosa se refere ao mencionar as profundezas da alma, as
alturas dos céus, o desespero do inferno, os fluidos e influências que curam, o paraíso, as
bem-aventuranças eternas e o próprio Deus.” Rubem Alves


A notícia abaixo apresenta diversos relatos por curas milagrosas contra o COVID 19 em África: material fundamental para a reflexão dos estudos da religião e de uma teologia que tem a justiça no coração de sua tarefa e espiritualidade.


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Chás "milagrosos" não curam Covid-19

Do chá distribuído de porta em porta em Madagáscar ao ervanário congolês que aconselha a beber urina, as "curas milagrosas" para a Covid-19 continuam a multiplicar-se em África. OMS avisa: não há evidências científicas.

Imagine este cenário: está em casa, ouve bater à porta e quando abre encontra um soldado que lhe oferece um chá de ervas contra a Covid-19. Pode parecer estranho, mas é o que tem estado a acontecer por estes dias em Madagáscar, depois de o próprio Presidente Andry Rajoelina ter elogiado uma bebida desenvolvida pelo Instituto Malgaxe de Investigação Aplicada (IMRA) a partir de artemísia, uma planta com eficácia comprovada contra a malária.

"Foram realizados testes. Duas pessoas estão agora curadas por este tratamento", afirmou Andry Rajoelina no início desta semana. O chefe de Estado foi ainda mais longe: "Este chá de ervas dá resultados em sete dias [...]. Podemos mudar a história do mundo inteiro".

Na terça-feira (21.04), foi a vez de os soldados defenderem a bebida na televisão nacional, desta vez atribuindo-lhe capacidades de prevenção. "Não há cura direta para o coronavírus", explicou o coronel Willy Ratovondrainy, médico do Exército. No entanto, insistiu, "a única solução, até agora, é reforçar a imunidade. E este remédio tradicional reforça a imunidade".

Soldados malgaxes fardados vão de porta em porta nas ruas da capital, Antananarivo, distribuir o chá aos habitantes. Mas a eficácia deste chá de ervas contra a Covid-19, provocada pelo novo coronavírus, não foi, porém, objeto de qualquer estudo científico publicado.

Supostas curas podem matar

Marcel Razanamparany, da Academia de Medicina de Madagáscar, confirma que o "medicamento" ainda tem de ser avaliado a nível científico e mostra-se preocupado com os potenciais efeitos secundários negativos que o chá que está a ser distribuído pelo Exército pode ter nas pessoas que o ingerem, particularmente em crianças.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) tem vindo a sublinhar que "não existem provas de que os medicamentos atuais possam prevenir ou curar a doença", embora reconheça que "os remédios tradicionais [...] podem aliviar os sintomas da Covid-19". Mas a organização alerta contra o uso de terapias caseiras não testadas.

A medicina tradicional é altamente respeitada em África. Muitos curandeiros, no entanto, estão a aproveitar a pandemia para venderem "banha da cobra". Em Nampula, no norte de Moçambique, onde a atividade dos médicos tradicionais está suspensa no âmbito do estado de emergência, a Associação dos Médicos Tradicionais prometeu mesmo tomar medidas contra todos os associados que se envolvam no suposto tratamento da Covid-19.

E a lista destes "supostos tratamentos" é extensa no continente: na República Democrática do Congo (RDC), um médico tradicional propõe uma "cura garantida" num anúncio numa rádio local: "Inalar os vapores de uma mistura de manga e casca de árvore, folhas de papaia e uma planta secreta". Nos Camarões, um naturopata sugere um remédio semelhante - só mudam os ingredientes da infusão - alho ou gengibre com extrato de menta, fervidos em água, bastarão para combater o vírus. Já um auto-intitulado ervanário congolês sugere beber a própria urina - sem qualquer base científica que comprove os alegados benefícios.

Entretanto, já há registo de vítimas mortais de falsas curas tradicionais para a Covid-19 propaladas no continente. Na semana passada, a Rádio Okapi, da ONU, noticiou a morte de três crianças na RDC depois de a mãe ter administrado aos filhos uma planta medicinal que se acredita ser capaz de

Ciência vs. Fé

Em Madagáscar, país muito pobre do Oceano Índico, a população, que toma regularmente remédios fitoterápicos (a partir de derivados vegetais), acolheu de braços abertos a inesperada e gratuita distribuição do chá de ervas 'Covid-Organics'. "Desde que vimos o Presidente Rajoelina bebê-lo na televisão, estamos ansiosos por o levar", disse Jean-Louis Rakotonandrasana, 58 anos, motorista de carro, depois de ter recebido sete sacos de chá de ervas.

"Uma saqueta para quatro litros de água, a ser tomada em dois copos por dia para um adulto e um copo para as crianças. É proibido para as mulheres grávidas", instruem os soldados. Com a distribuição deste remédio tradicional, as autoridades malgaxes pretendem "proteger a população através da sensibilização contra o vírus e do reforço do seu sistema imunitário", numa altura em que o país regista 121 casos de Covid-19.

O Centro norte-americano de Controlo e Prevenção de Doenças tem estado a pedir vigilância para as alegadas curas tradicionais: "Não há qualquer evidência científica de que qualquer destes remédios alternativos possa prevenir ou curar a doença da Covid-19. Na verdade, alguns deles podem não ser seguros para consumo".

Ainda assim, enquanto a comunidade médica internacional continua em busca de um tratamento e vacina eficazes, a procura continua em alta, numa combinação de desespero e fé na medicina tradicional. Segundo a Organização Mundial de Saúde, há "vários ensaios clínicos em curso" tanto de medicamentos ocidentais como tradicionais. E curandeiros em vários países africanos exigem ser tidos em conta pelas autoridades de saúde na procura de uma solução, uma vez que a medicina convenvional ainda não foi capaz de o fazer.

Nos Camarões, o diretor de controlo de doenças do Ministério da Saúde, Georges Etoundi Mballa, garante que a porta não está fechada à participação da medicina tradicional: "Estamos abertos. Nada está excluído. Todos aqueles que consigam providenciar uma resposta científica, incluindo médicos tradicionais, são bem-vindos". Na África do Sul, o porta-voz do Ministério da Saúde diz que o departamento recebe cerca de 10 chamadas por dia de pessoas que alegam ter a cura para a Covid-19. O Governo reconhece o papel dos curandeiros, diz Pop Maja: "Respeitamos o seu papel [...] mas para já não há cura, sabemos que não há cura para o coronavírus".

Entre a liberdade religiosa e o bem público: reações a restrições religiosas para impedir a disseminação de Covid-19 na Nigéria




- por Prof. Dra. Jacinta Chiamaka Nwaka
20 de maio de 2020

Antecedentes: Covid-19 na Nigéria

A Nigéria confirmou seu primeiro caso de Covid-19 em 27 de fevereiro de 2020, quando um cidadão italiano em uma viagem de negócios de Milão que havia chegado a Lagos em 25 de fevereiro apresentou resultado positivo para o vírus. Em 22 de março, quando os governos nos níveis federal e estadual começaram a intensificar as medidas para conter o contágio, cerca de 27 casos já estavam confirmados.1 Havia preocupações generalizadas de que o frágil sistema de saúde pública do país mais populoso da África, com uma população de 200 milhões de pessoas, seria incapaz de lidar com uma pandemia em rápida expansão. Exigiria uma ação rápida para impedir que um grande número de pessoas fosse infectada e fornecer tratamento aos pacientes Covid-19 existentes. Segundo algumas projeções, 39.000 infecções poderiam ser registradas na capital comercial, Lagos.2 Havia também o medo de que o Covid-19 causasse um grande impacto na economia do país. O Conselho Consultivo Econômico Presidencial de Abuja destacou alguns dos desafios que a pandemia pode representar em uma época em que o preço global do petróleo, a principal exportação do país, está em queda livre e em meio a altos níveis de desemprego e pobreza generalizada. No momento da redação deste artigo, a Nigéria tinha 5.182 casos confirmados de Covid-19 e 167 mortes, com 1.180 pessoas que receberam alta do hospital. Embora o Covid-19 tenha se espalhado para trinta e quatro dos trinta e seis estados da Nigéria, as indicações são de que as taxas de infecção ainda não atingiram o pico e o número de mortes permaneceu relativamente baixo.

Explicações para a baixa incidência de Covid-19 na Nigéria

Várias explicações foram apresentadas para a incidência relativamente baixa de Covid-19 na Nigéria. Isso inclui a "teoria do clima quente", baseada na visão de que o novo coronavírus não pode prosperar no clima quente da Nigéria.3 A crença de que o calor destrói o novo coronavírus também tornou popular a prática da inalação de vapor entre os nigerianos. Outra escola de pensamento, especialmente entre as pessoas religiosas, explica as baixas taxas de infecção como providenciais.4 Enquanto isso, alguns analistas argumentam que o baixo número de infecções na Nigéria é mais um reflexo da escassez de kits de teste, o que limita a capacidade do país de capturar o vírus. extensão total da pandemia. Eles argumentam que o aumento de testes confirmaria a existência de muitos outros casos.5

O governo lançou um conjunto de diretrizes para ajudar a impedir a propagação do vírus, incluindo: bloqueios; pedidos de estadia em casa; fechamento de escolas governamentais, fronteiras e aeroportos nacionais e internacionais; uso de máscaras faciais; distanciamento social; e restrição de atividades sociais, incluindo reuniões religiosas. No entanto, algumas medidas restritivas, particularmente a proibição de reuniões religiosas, não foram bem recebidas por muitos nigerianos.

Restrições religiosas: reações e contra-reações

Dependendo do estado, as diretrizes para reuniões sociais, incluindo o culto religioso congregacional, têm atendimento limitado a entre vinte e cinquenta pessoas, além de exigir distanciamento social. No caso de Kaduna, uma cidade no centro-norte da Nigéria, o culto religioso congregacional foi suspenso. Em reação ao banimento do culto religioso congregacional, algumas denominações religiosas, em conformidade com as diretrizes do governo, adotaram novos modos de praticar sua fé. Enquanto alguns recorrem a cultos on-line, outros desenvolvem cultos em células domésticas, dividindo seus membros em unidades menores. Alguns dividem seus cultos em vários edifícios, estacionamentos e campos em vários intervalos. Aqueles com congregações muito grandes, que consideram impossível aderir às regras, suspenderam todas as reuniões religiosas, ordenando que seus membros orassem em casa. Algumas organizações religiosas, além de disponibilizarem suas instalações para contenção do Covid-19, apoiaram os esforços do governo fornecendo doações para os mais vulneráveis.6

No entanto, vários ministros religiosos que desafiaram as restrições do governo foram assediados ou presos por agentes de segurança durante os cultos. Foram realizadas detenções nos estados de Abuja, capital e Ogun, Lagos e Kaduna, nas duas primeiras semanas após as ordens de restrição. Um dos incidentes que gerou críticas generalizadas nas mídias sociais ocorreu em Abuja e envolveu um grupo de seguranças liderados por Ikharo Attah que invadiram a Igreja da Família Jesus Reigns no distrito de Apo em 29 de março e prenderam o pastor durante o serviço da igreja. Alega-se que o mesmo grupo de segurança havia poupado alguns imãs e fiéis em uma mesquita no distrito de Maitama, em Abuja, da prisão, em vez disso, apelando para que respeitassem os regulamentos do governo. Isso alimentou especulações de que alguns agentes de segurança e esquadrões da polícia estavam aplicando as regras de maneira diferente a igrejas e mesquitas.
Além disso, alguns ministros da igreja que viram o Covid-19 e suas restrições concomitantes como satânicas afirmaram ter soluções rápidas para a pandemia. Entre eles estavam TB Joshua, que previu que o Covid-19 desapareceria após fortes chuvas em 27 de março, e Elijah Ayodele, que alegou estar em posse de água benta e óleo que poderia curar a doença.8 Além disso, em 13 de abril de O bom coração Val Aloysius, da Igreja Internacional da Casa do Pai em Calabar, pediu ao governo que reunisse todos aqueles que haviam testado positivo para o Covid-19 em um centro de isolamento para que ele os curasse. Para enfatizar sua seriedade, ele pediu ao governo que o enforcasse se ele não curasse todos aqueles que haviam testado positivo.9

Após a extensão das restrições, alguns líderes religiosos que antes se calaram sobre as medidas do governo acrescentaram suas vozes às críticas às restrições. Por exemplo, o bispo anglicano de Amichi, Ephraim Ikeakor, ao criticar seus colegas clérigos por terem fechado suas igrejas, argumentou que as massas precisam de alimento físico e espiritual para sobreviver à pandemia.10 Apoiando a perspectiva dos críticos, um desenho animado que o diabo zombando de Cristo por ter destruído suas igrejas foi divulgado pelas mídias sociais. Indiscutivelmente, essas críticas informaram parcialmente a iniciativa de alguns governadores estaduais de relaxar as restrições religiosas em um período crítico da campanha anti-Covid-19 na Nigéria para as celebrações da Páscoa.11 Embora alguns deles tenham mudado de idéia, tais movimentos, juntamente com o críticas após as prisões de líderes religiosos por agentes de segurança por violarem ordens de restrição, sublinham o potencial da religião de comprometer os esforços do governo para conter o Covid-19. No entanto, arrastar a luta contra o coronavírus para as complexas políticas da religião pode ter conseqüências adversas para a paz e a segurança na Nigéria.

Lições

A religião tem potencial para promover e impedir o bem público. Embora a comunidade religiosa da Nigéria esteja contribuindo para a luta contra o Covid-19 na Nigéria, dadas as reações que seguiram as medidas restritivas, ela é igualmente capaz de frustrar os esforços do governo para controlar a doença. Portanto, ao responder à pandemia, o governo não deve ignorar a volatilidade da religião. Quanto aos líderes religiosos que ofereceram soluções rápidas e milagrosas para o Covid-19, as controvérsias que se seguiram tentaram politizar as restrições do governo e evidências crescentes da trajetória do Covid-19 apontam para as limitações das intervenções religiosas. Existe uma clara necessidade de expandir a busca de soluções para a pandemia em um país com altos índices de pobreza e desemprego e infraestrutura de saúde fraca.



Sobre a autora: possui doutorado em história pela Universidade de Ibadan, Nigéria. Ela ensina história da Nigéria e da África no Departamento de História e Estudos Internacionais da Universidade do Benin, na Nigéria. Sua pesquisa se concentra na história social e religiosa, com um interesse especial na história de conflitos religiosos, estudos de gênero e paz e gestão de conflitos na Nigéria e na África de maneira mais ampla.

Fonte:

Dez teses teológicas sobre o COVID-19 na África - Conferência das Igrejas de Toda África




  
- Preâmbulo

Teologia é conversa de Deus. A maneira como falamos de Deus em relação a todos os aspectos da vida determina se  vivemos e agimos de acordo com nossa fé. A integridade e relevância de nossa fé, portanto, repousa em como falamos sobre Deus em todas as situações. Nestes tempos difíceis da pandemia global do COVID-19, temos a tarefa de fornecer reflexões teológicas para guiar o pensamento e as ações da igreja e de seus membros. Começamos reconhecendo que Deus permite que coisas ruins e boas aconteçam no mundo.

Em 11 de março de 2020, a OMS declarou uma pandemia o COVID-19, originário de Wuhan, China, apenas três meses antes. Em três meses, a doença atingiu o estado de pandemia e, em 30 de abril, foram registrados 3.267.184 casos e 229.971 mortes. A doença se espalha através de aerossóis respiratórios. Sem tratamento nem vacinação disponíveis, as medidas de controle dependem da higiene respiratória e das mãos, distanciamento físico e restrições de viagem. A intervenção mais extremada chamada “bloqueio” está sendo adotada em muitos países, onde a maioria das reuniões é proibida e as pessoas são convidadas a ficar em ambientes fechados por longos períodos - com graves consequências socioeconômicas, como perda de emprego, colapso de negócios e perda geral de meios de subsistência. Práticas em torno dos principais ritos de passagem, como o batismo, e particularmente os funerais, são desafiadas.

Desde o seu surgimento em dezembro de 2019, o mundo está enfrentando o COVID-19. Nada uniu o mundo na luta contra um inimigo comum mais do que o COVID-19. O COVID-19 e seu impacto são inéditos na nossa memória viva, atraindo assim teorias da conspiração, especulações e diversas interpretações teológicas. A Conferência de Igrejas de toda a África (AACC) propõe as seguintes dez teses teológicas sobre a pandemia para ajudar as igrejas à medida que continuam refletindo e agindo:

Tese 1: CADA INTERPRETAÇÃO SOBRE A ORIGEM E O PROPÓSITO DA COVID-19 É SUPOSIÇÃO.

‘Porque os meus pensamentos não são os seus, nem os seus caminhos, os meus caminhos, diz o Senhor. Pois como os céus são mais altos que a terra, assim são os meus caminhos mais altos que os teus caminhos e os meus pensamentos que os teus pensamentos. '(Isaías 55: 8-9).

Em tempos de angústia e confusão como essa, é natural que os seres humanos perguntem a origem e o propósito da calamidade. Os teólogos também dão possíveis interpretações e explicações, na maioria das vezes usando textos bíblicos como prova. Na época do COVID-19, existem muitos professores, pregadores e ministros que dão explicações teológicas diferentes sobre a origem e até o propósito da pandemia. Através da mídia e redes sociais, o COVID-19 foi interpretado teologicamente de diferentes maneiras: por exemplo como um sinal do fim dos tempos, como o julgamento de Deus do mundo por todos os tipos de pecados (por exemplo, sexualidade ou destruição do meio ambiente e por precipitar mudanças climáticas, etc.). A evidência bíblica e a experiência histórica cristã provam que, de fato, toda tentativa de explicar tal explicação permanece uma especulação, mesmo quando apoiada por citações bíblicas ou textos de prova. Não podemos afirmar que somos capazes de conhecer Deus completamente através de tais eventos. Muitas explicações no passado foram provadas erradas. Embora seja bom tentar entender teologicamente tais eventos, ninguém deve e pode reivindicar correção absoluta. Tomemos todas as explicações e interpretações como questão de debate e consideração adicional.


Tese 2: DEVEMOS EXAMINAR CRITICAMENTE TODAS AS ALEGAÇÕES DE PROFECIA

"Que dois ou três profetas falem, e que os outros pesem o que é dito." 1Cor 14:29

Em tempos de crise como o atual COVID-19, os falsos profetas e charlatães religiosos exploram para aterrorizar os crentes com uma propagação do medo. Desde o aparecimento do COVID-19, algumas profecias e pregações da palavra de Deus tomaram direções diferentes e confusas ao explicar biblicamente o que é a pandemia e sua origem. Vários afirmam ser profetas que receberam visões e sinais; eles não querem ser questionados ou duvidados, para que não extinga o Espírito. Por causa do risco associado àqueles que afirmam falar em Nome de Deus, esperando que as pessoas digam apenas “Amém”, a Bíblia nos adverte e nos aconselha a estar vigilantes e a não aceitar nada simplesmente porque alguém afirma ser profeta. Embora alguns que professam ter o Espírito de Cristo devam crer, ainda nem todos; e embora o Espírito não deva ser extinto, nem profetizando que seja desprezado, ainda assim deve-se tomar cuidado com o que é ouvido e recebido. Somos chamados a testar todo espírito e toda profecia deve ser pesada. Lemos: 'Amados, não acreditem em todos os espíritos, mas testem os espíritos para ver se eles são de Deus, pois muitos falsos profetas foram ao mundo.' (1 João 4: 1). Testes dos espíritos, luz espiritual, conhecimento, julgamento, experiência e orientação divina são necessários, o que deve ser feito sem medo de questionar Deus. Todos os crentes diligentes e indagadores humildes são capazes de julgar pessoas e doutrinas, independentemente de o que dizem ser do Espírito de Deus ou não, pois o Espírito de Deus nunca fala contrário à palavra de Deus.


Tese 3: Desencorajamos a interpretação apocalíptica da pandemia

'Mas daquele dia e hora ninguém sabe, nem mesmo os anjos no céu, nem o Filho, mas apenas o Pai' '(Marcos 13: 32).

Essa pandemia não é a primeira da história. Houve muitas pragas e eventos mais devastadores do que este. Cada vez há uma tentação de interpretar tais eventos, incluindo o surgimento do novo milênio no ano de 2000, que foram interpretados apocalípticamente. E sabemos que essas interpretações eram falsas, porque o mundo continua e Jesus ainda não chegou. Jesus proibiu seus discípulos de prever a hora exata de seu retorno. Eles deveriam continuar seu trabalho como se Jesus não estivesse vindo, pois ele virá no momento em que menos se espera. Paulo declara em 1 Tessalonicenses 5: 2: 'Pois vocês sabem perfeitamente que o dia do Senhor vem como ladrão à noite'. Como cristãos, devemos esperar pela Parousia, não como uma ameaça de punição e julgamento, mas mais alegremente com esperança de redenção eterna. Muito provavelmente o mundo não terminará com o Covid-19; devemos preferir planejar como continuar com nossa vida e serviço do Senhor e pregar a mensagem de esperança para o futuro.

Tese 4: Mesmo sofrendo e morrendo, sabemos que Deus promete estar conosco.

Eu já disse isso para que em mim você tenha paz. No mundo você enfrenta perseguição. Mas tenha coragem; Eu venci o mundo ”(João 16: 33).

Jesus nunca prometeu a vida sem sofrer por diferentes razões. A morte faz parte da vida, com a dor e o sofrimento que sempre traz. Enquanto estava a caminho da cruz, Jesus diz a seus discípulos que tenham paz. Mas essa paz é apesar da perseguição que eles enfrentarão. Ele diz que venceu, conquistou o mundo precisamente a caminho do Gólgota. Portanto, qualquer teologia que promete vida sem dor, doença, morte não está de acordo com Cristo. Mesmo com a oração e o jejum, como fazemos durante esta pandemia, não há garantia de que ela desaparecerá imediatamente. O desafio é como ter paz e ter a presença e o cuidado de Deus, mesmo quando estamos sofrendo, até a morte, devido a essa pandemia. Nossa teologia deve levar a sério o fato de que mesmo com o COVID-19, mesmo quando muitas pessoas morrem e algumas são curadas, a presença de Emmanuel, Deus conosco, é garantida. Podemos estar orando pela graça de Deus, para poder "beber do copo", se necessário, sem perder a fé. Nossa paz e mensagem são como Paulo, dizendo: “Pois estou convencido de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os governantes, nem as coisas presentes, nem as coisas que virão, nem as coisas que virão, nem os poderes, 39, nem a altura, nem a profundidade, nem nada mais. em toda a criação, será capaz de nos separar do amor de Deus em Cristo Jesus, nosso Senhor (Romanos 8: 38-39). Mesmo na morte, temos uma promessa de ressurreição, pois: “Quando esse corpo perecível impõe imperecibilidade e esse corpo mortal impõe a imortalidade, então o ditado escrito será cumprido: 'A morte foi tragada pela vitória'. " (1 Coríntios 15:54)

Tese 5: COVID-19 É UM CHAMADO PARA A IGREJA

'Portanto, ele diz: Desperte os que dormem, ressuscite dentre os mortos, e Cristo lhe dará luz.' Veja que você anda circunspectamente, não como tolos, mas como sábios, resgatando o tempo, porque os dias são maus. Portanto, não seja imprudente, mas entenda qual é a vontade do Senhor. (Efésios 5: 14-17).

COVID-19 causou medo e ansiedade. Todos os sistemas econômicos, financeiros e de saúde em literalmente todas as sociedades foram afetados. A igreja e a sociedade foram desafiadas a repensar a maneira como vivemos, cooperamos e avaliamos nossas responsabilidades no mundo. O chamado das igrejas à diaconia prática foi reacendido. Viemos para aplaudir e apreciar o dom do conhecimento, pois os cientistas estão trabalhando duro para encontrar uma cura e uma vacina. Valorizamos cada vez mais profissionais da saúde que arriscam suas vidas para salvar outras pessoas. A África viu um ressurgimento dos recursos tradicionais para cura e cuidados. Estamos mais conscientes da conexão e interdependência do mundo do que antes. O papel da fé também foi elevado, com a noção de dependência de Deus sendo revelada à medida que nos vemos desamparados. Nossa ajuda vem do Senhor (Sl 121: 1-2).

Tese 6: COVID-19 É UMA ADVERTÊNCIA ÀS IGREJA PARA ESTAREM EM SOLIDARIEDADE COM OS POBRES E OS VULNERÁVEIS

"Em verdade vos digo, assim como você fez com um dos menores membros da minha família, você fez comigo." (Mateus 25:40)

O COVID-19 impactou as pessoas de maneira diferente. Nas nações, cidades e vilas onde a igreja está presente, lembre-se de levar a sério seu chamado de solidariedade com os mais
vulnerável. Os pobres, os sem-teto, os desempregados, os refugiados e as pessoas deslocadas sofrem mais do que aqueles cuja situação econômica e social lhes permite se cuidar melhor. Com os bloqueios, ouvimos falar de um aumento dramático na violência de gênero contra mulheres e crianças. Pessoas com deficiência não são cuidadas
devidamente. E aqueles que se recuperaram da doença enfrentam estigma em suas próprias comunidades. As igrejas na África, no espírito do Ubuntu, são chamadas a se lembrar de Jesus dizendo que a maneira como o servimos é servindo as pessoas em nosso meio que precisam de atenção extra de maneiras diferentes. E agradecemos a Deus que muitas igrejas estão fazendo isso.


Tese 7: Entendemos melhor o que significa "vida abundante"

"Eu vim para que eles tenham vida e a tenham em abundância." (João 10:10)

É comum associar "vida abundante" prometida por Jesus com coisas materiais. Riqueza e bem-estar são apresentados como o resultado final de nossa fé e como cumprimento da promessa de Jesus. A busca interminável da riqueza leva à corrupção de nossos líderes, como resultado da ganância e do egoísmo, para sempre querer mais. O surto de COVID-19 ensinou à humanidade que as coisas que mais procuramos não são tão valiosas. Reconhecemos que a maior parte do que possuímos nunca é realmente necessária, pois estamos sob restrições de bloqueios onde não precisávamos deles nem fomos capazes de usá-los. É um apelo particular a nossos líderes para que se concentrem no que mais importa em nossa vida juntos, quando enfrentamos vulnerabilidade mútua, por meio de investimentos em serviços sociais, particularmente sistemas de saúde que na África estão em estados muito precários. Assim como Paulo ensinou em 1 Timóteo 6: 7-8: “Porque nada trouxemos ao mundo, para que nada possamos tirar dele; mas se tivermos comida e roupas, ficaremos satisfeitos com isso. " E a vida abundante só é possível quando é para todos, não apenas para alguns privilegiados.

Tese 8: DISTÂNCIA FÍSICA APELA À CONTEXTUALIZAÇÃO DA TEOLOGIA DE NOSSA VIDA DE COMUNIDADE COMO IGREJA.

"Porque onde dois ou três estão reunidos em meu nome, eu estou lá entre eles." (Mateus 18:20)

As restrições das reuniões físicas apresentaram à igreja um raro desafio e oportunidade de interrogar o que significa encontrar-se como congregação. Em muitos países, os cultos das igrejas em estruturas físicas foram proibidos e onde ainda são permitidos, estão sob severas restrições ao contato físico. Somos desafiados teologicamente sobre como entender a presença de Jesus entre nós, como prometido, especialmente quando não podemos celebrar juntos os sacramentos no mesmo espaço físico. Ao mesmo tempo, encontramos uma rara oportunidade de abraçar possibilidades de praticar reuniões sociais virtualmente, por meio do compartilhamento de sermões por meio eletrônico, transmissão ao vivo de serviços, cadeias de oração em todo o mundo, oferta por serviços de dinheiro móvel, etc. também é uma oportunidade de repensar o lar como um local de culto para a família. Esperamos para ver como esse novo fenômeno afetará nossa vida juntos como congregações após a pandemia, porque não se pode abraçar um computador de telefone.

Tese 9: PRECISAMOS REPENSAR AS PRÁTICAS FUNERÁRIAS E DE LUTO 

Quando Jesus a viu chorando, e os judeus que a acompanharam também choraram, ele ficou muito perturbado em espírito e profundamente comovido.” João 11:33.

Jesus participando de um funeral demonstra o significado de apoiar as famílias enlutadas para transmitir uma mensagem de esperança e segurança da vida após a morte. O distanciamento físico devido ao COVID-19 faz com que muitos cristãos se perguntem como cumprir seu dever de "regozijar-se com os que se alegram, chorar com os que choram" (Romanos 12:15) e permanecer consistentes com os protocolos do governo de combater a pandemia para proteger tudo seja infectado ou infectando outras pessoas. Para os africanos, um funeral é um evento emocional, social, espiritual, público muito significativo e faz parte do fechamento. Portanto, espera-se a participação em um funeral de parentes e amigos, incluindo aqueles em outras aldeias, cidades e no exterior. O distanciamento social representa um desafio à prática cultural e espiritual de um enterro decente, enquanto, ironicamente, ajuda a repensar a irrelevância da crescente comercialização e ostentação de funerais em toda a África. Precisamos encontrar uma nova narrativa teológica para acomodar as necessidades daqueles que estão de luto e daqueles que perdem o evento.

Tese 10: APELAMOS AOS GOVERNOS QUE CUMPRAM SEU DEVER DE ASSEGURAR BEM-ESTAR A TODOS

"Pelo amor de Deus, aceite a autoridade de toda instituição humana, seja do imperador como supremo, seja dos governadores, enviados por ele para punir aqueles que fazem o mal e louvar os que fazem o que é certo". (1 Pedro 2: 13-14).

Os governos têm o dever de proteger os cidadãos da contaminação do COVID-19 e garantir tratamento, cuidados e segurança para os doentes, suas famílias e o bem-estar de todas as pessoas. É por esse motivo que a Bíblia diz que os governos são designados por Deus e devem ser respeitados e obedecidos (Romanos 13). As igrejas estão seguindo e apoiando
protocolos governamentais para combater a transmissão do vírus, mesmo quando esses protocolos restringem as formas usuais de exercer sua fé. Mas existem governos que cumprem seu dever e aqueles que estão corrompidos, descuidados ou opressivos. A igreja tem o dever profético de lembrar e garantir que o estado defenda a justiça e a equidade ao implementar medidas drásticas para combater a infecção pelo COVID-19. A defesa dos vulneráveis ​​a viver uma vida digna, a condenação da brutalidade contra o povo e a convocação de abusos e práticas corruptas não devem ser vistos como atos de deslealdade e desobediência, mas como um papel profético da igreja.

FONTE:

quarta-feira, 27 de maio de 2020

Como um evento pró-Israel de 'Diplomacia Espiritual' se tornou um super foco de contágio do COVID-19 na África do Sul


O lobby pró-Israel junto às Igrejas na África apresenta muitos problemas e desafios para a teologia pela paz justa em África e no Oriente Médio. Conheça o relato acontecido na África do Sul em que o lobby religioso desconsiderou as ameaças reais do COVID 19 em nome de uma suposta "ordem de Deus". Os resultados são desastrosos para a saúde e para a fé.
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Nos dias 10 e 11 de março, várias centenas de convidados se reuniram nos Ministérios da Restauração Divina, nos arredores de Bloemfontein, capital da província de Estado Livre na África do Sul, para assistir ao café da manhã de oração em Jerusalém (JPB). O JPB é um movimento de oração que visa reunir líderes do governo, políticos e líderes cristãos para - de acordo com seu site - “responder à ordem de Deus e ao chamado do Knesset [parlamento israelense] às nações para orar pela paz de Jerusalém e pela prosperidade. de Israel. " Acabar com a ocupação ilegal da Palestina por Israel não faz parte deste chamado à oração.

Os freqüentadores de igrejas vieram de toda a África do Sul para participar de vários eventos como parte dessa iniciativa de advocacia pró-Israel baseada na fé, que é apoiada pelo parlamento israelense. Cerca de 480 pessoas participaram de uma sessão de culto à noite em 10 de março. Um grupo de 225 pessoas participou do evento do café da manhã na manhã seguinte, seguido de uma sessão de oração no jantar com a participação de 160 pessoas. O coordenador do JPB, Albert Veksler, estava entre os dois israelenses, dois americanos e um francês que estiveram presentes e eram portadores do COVID-19, mas não sabiam.

"Algo muito significativo aconteceu"
Veksler descartou o coronavírus, chamando-o de "distração". Ele acrescentou que manter o JPB mesmo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarando o COVID-19 uma pandemia global foi "uma grande vitória". "Algo muito significativo aconteceu e nós éramos testemunhas e participantes", disse Veksler à Gateway News em uma entrevista imediatamente após o término do evento. Ele estava certo.

Durante o JPB em Bloemfontein, os participantes discutiram como fazer lobby por Israel na África do Sul usando igrejas e movimentos políticos, orações compartilhadas e refeições suntuosas e - desconhecido para ninguém - o coronavírus. Os fiéis então se espalharam pela província de Estado Livre e pela África do Sul, levando o COVID-19 com eles. Angelize de Lange, uma empresária de 57 anos, voltou a Joanesburgo. Membro do Parlamento e líder do Partido Democrata Cristão Africano (ACDP), o reverendo Kenneth Meshoe, que foi o orador principal do evento, retornou às suas funções parlamentares na Cidade do Cabo. Um casal de pastores voltou à província de Northern Cape, com outros retornando a KwaZulu-Natal e Eastern Cape. Os líderes da igreja retornaram às suas congregações.

Em 16 de março, os cinco convidados estrangeiros foram testados para o COVID-19 depois que o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, anunciou que todos os convidados internacionais na África do Sul devem passar por testes antes de deixar o país. Todos os cinco testaram positivo. A pressa estava agora em rastrear e testar todas as pessoas que entraram em contato com elas.

As equipes de rastreamento foram forçadas a expandir suas buscas além das fronteiras do Estado Livre para outras cinco províncias. Os esforços de busca do Departamento de Saúde foram assistidos por centenas de voluntários da Cruz Vermelha, além de especialistas do Instituto Nacional de Doenças Transmissíveis da África do Sul. Unidades móveis de teste foram enviadas ao Estado Livre para garantir que todos os membros da igreja fossem testados. "Sabíamos que era vital agir rapidamente no Estado Livre e mobilizar recursos para a área para testes em larga escala, rastreamento, rastreamento e quarentena", disse o ministro da Saúde, Zwelini Mkhize. Em 2 de abril, Mkhize informou que 1.600 dos 1.700 contatos em seis províncias haviam sido rastreados e testados.

As consequências mortais
As consequências da reunião do JPB foram generalizadas e sem precedentes em termos de transmissão local. A província de Estado Livre não tinha um único caso conhecido de coronavírus quando o JPB começou em 10 de março. Em 31 de março, havia 74 casos - mais de 67 eram resultado do JPB. Em 8 de abril, subiu para 88.

Seis dias depois de deixar o JPB, Meshoe - sem saber que estava exposto ao COVID-19 - se reuniu com o presidente Ramaphosa, o vice-presidente David Mabuza e os líderes de vários partidos políticos da Cidade do Cabo para discutir a resposta da África do Sul à pandemia de coronavírus. Isso provocou uma enxurrada de testes entre os líderes políticos. Ramaphosa deu negativo.

A Clínica Duduza, que atende comunidades pobres no leste de Joanesburgo, foi fechada indefinidamente a partir de 2 de abril, depois que uma enfermeira deu positivo. Ela estava no JPB em Bloemfontein.
O pastor Mohau Rammile representou os Ministérios de Reconciliação Global no JPB; ele transmitiu o vírus ao colega ministro da GRM, John Hlangeni, 86 anos. Hlangeni morreu em 30 de março. Em 8 de abril, quando a África do Sul entrou no dia 13 de um bloqueio de 21 dias, Mondli Mvambi, porta-voz do Departamento de Saúde do Estado Livre confirmou as mortes de Willem van Tonder, de 76 anos, e de Frans Thafeni, de 55 anos. Ambas as mortes foram ligadas ao evento JPB.

O evento JPB é um exemplo de um evento de “super propagação”, pois muitos dos que compareceram mais tarde entraram em contato com um grande número de pessoas quando voltaram para casa. Com altos níveis de desemprego e pobreza, o HIV e a tuberculose são tão comuns nas comunidades de Bloemfontein e, portanto, muitas pessoas são imunossuprimidas, isso foi catastrófico para a província do Estado Livre. Muitos vivem em municípios superlotados e em assentamentos informais, onde os regulamentos de distanciamento social e bloqueio são difíceis de aplicar e a higiene básica é difícil de observar.

A "diplomacia espiritual" de Israel na África
A questão central é por que os organizadores israelenses estavam tão desesperados para manter o JPB na África do Sul, apesar da disseminação letal do coronavírus? A resposta está na necessidade urgente de Israel de encontrar novos amigos.

Benignamente descrito como uma “reunião da igreja” na mídia sul-africana e com uma declaração de missão apimentada com referências bíblicas, o Café da Manhã de Oração de Jerusalém alega que seu objetivo é simplesmente orar pela paz. Na realidade, o JPB - vestido com roupas religiosas - é uma parte vital dos esforços de lobby político de Israel na África.

O diretor do JPB, Albert Veksler, chefiou o Israel Empowerment Lobby (IEL) entre 2012 e 2014. Um componente-chave do trabalho do IEL é a “Diplomacia Espiritual”, que utiliza uma crença comum de muitos cristãos - particularmente das igrejas evangélicas, pentecostais e carismáticas - que o Estado de Israel é especial para Deus e um cumprimento da profecia bíblica. A Veksler agora usa o JPB como um veículo para capitalizar a centralidade de Israel no cristianismo, especialmente na África. Como Israel enfrenta uma crescente reação internacional por sua ocupação militar da Palestina que está sendo cada vez mais comparada ao apartheid da África do Sul, esse sentimento se mostrou útil.

Israel teve que olhar além dos tradicionais aliados ocidentais em busca de apoio. O regime do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu se voltou para a África Subsaariana, em um esforço para construir novas alianças, combater uma campanha global de boicote, desinvestimento e sanções (BDS) e obter apoio nas Nações Unidas (ONU). Em toda a África, Israel está usando evangélicos cristãos para espalhar sua propaganda, neutralizar críticas às violações dos direitos humanos em Israel e obter simpatia e lealdade por Israel na África. A parceria de Israel com as igrejas africanas faz parte de um esforço diplomático em todo o continente, destinado a dissolver o apoio tradicional da África à autodeterminação e à justiça palestinas. O JPB não é apenas sobre orar, é sobre lobby político.

O Gana sediou o primeiro JPB na África em setembro de 2018. Em maio de 2019, o movimento mudou-se para a África Oriental e Uganda. Reconhecendo o valor político e moral da África do Sul no continente e a necessidade de ganhar presença no sul da África e neutralizar o crescente movimento de boicote da África do Sul, o JPB foi trazido para Bloemfontein em 2020. Com o governo sul-africano já iniciando o processo de rebaixamento das relações com Israel, houve um desespero generalizado em Tel Aviv. Nem mesmo uma pandemia global sem precedentes impediria os advogados de Israel de tentar se estabelecer na África do Sul.

Israel já tem uma história tóxica na África do Sul. Mas sua insistência desesperada em fazer lobby no país e realizar o café da manhã de oração em Jerusalém durante a pandemia de coronavírus agora se tornou mortal. A ocupação brutal de Israel da vida palestina e sua abordagem geral à governança é sacrificar os fracos. Em Bloemfontein, os sul-africanos experimentaram isso em primeira mão.


- tradução provisória de:
https://www.middleeastmonitor.com/20200409-how-a-pro-israel-spiritual-diplomacy-event-became-a-covid-19-super-spreader-in-south-africa/

Vírus, maldição ou profecia? como os Pentecostais africanos entendem a pandemia do COVID-19


 - por Tinashe Chimbidzikai é candidato a PhD na Universidade Georg-August de Göttingen e candidato externa a PhD no Programa de Pós-Graduação em Estudos Africanos, Centro de Estudos Africanos de Leiden. Ele também é pesquisador de doutorado no Instituto Max Planck para o Estudo da Diversidade Religiosa e Étnica. O título de trabalho de sua pesquisa é "(Re) produção e imaginação do espaço social urbano por imigrantes pentecostais na África do Sul: uma etnografia narrativa."


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Quinta-feira, 12 de março de 2020. Uma semana antes, o primeiro caso confirmado de COVID-19 é relatado pelo ministro da Saúde da África do Sul. Avançando rapidamente uma semana depois, ainda é normal, como sempre, neste movimentado mercado superlotado nos subúrbios do noroeste de Joanesburgo. Vejo algumas pessoas com máscaras faciais e desinfetantes para as mãos aqui e ali. O resto parece alheio à pandemia que já causou estragos em partes da Ásia, Europa e agora nos Estados Unidos da América. Normalmente saio no mercado com um de meus interlocutores, Thomas, que neste dia está ocupado como em qualquer outro dia.

A Bíblia nos adverte
"Como cristão, estou sempre preparado [para qualquer coisa], pois a Bíblia nos adverte a vigiar, porque você não sabe o dia nem a hora", opinou Thomas, um imigrante pentecostal zimbabuense de trinta e nove anos que vive em África do Sul, imperturbável pelos crescentes casos confirmados de COVID-19 na África. Indiferente, ele cuida dos seus negócios diários, vendendo mabhero (roupas de segunda mão) sem máscara, luvas descartáveis ​​ou desinfetante para as mãos neste mercado movimentado. Em 1.462, a África do Sul tem o maior número de casos de COVID-19 na África, com cinco mortes neste país economicamente avançado, mas extremamente desigual, de 58 milhões de pessoas. ‘Se eu ficar em casa, não terei comida na mesa. Se a situação continuar assim, não poderei pagar meus aluguéis este mês nem enviar dinheiro para minha esposa e minha mãe no Zimbábue. Então, tenho que trabalhar até o governo ordenar que paremos. Só Deus pode me proteger dessa coisa [coronavírus] '.
"Mesmo se eu for infectado, ficarei bem porque sou saudável. Pelas suas pisaduras eu serei curado. O problema é que os cristãos são movidos pelo medo, não pela fé. Precisamos permanecer na palavra de Deus. Este é apenas um vento soprador que em breve passará ', declara Thomas enquanto atende seus clientes vasculhando roupas em segunda mão em sua barraca movimentada.

Domínio pentecostal na África do Sul
A religião é uma realidade indispensável na vida cotidiana da grande maioria do povo africano. O Pew Research Center relata que seis em cada dez pessoas se identificam como cristãos, seguidos por três em cada dez muçulmanos. Cerca de três por cento não se identificam com nenhuma religião, e uma porcentagem semelhante segue várias formas de religiões tradicionais africanas. Hindus, budistas e judeus representam cada um menos de um por cento da população da África Subsaariana (SSA). Na África do Sul, 80% são cristãos com 55% de auto-identificação como pentecostal / carismática. A África do Sul tem uma longa história com o pentecostalismo, que remonta à primeira década do século XX. As configurações pentecostais se transformaram ao longo dos séculos, à medida que o cenário político, econômico e sociocultural do país mudava. Por exemplo, com o aumento do fluxo de imigrantes de países vizinhos e além, após o fim do apartheid em 1994 e a inauguração de uma nova dispensação democrática, a África do Sul experimentou um enorme crescimento de igrejas pentecostais estabelecidas por imigrantes. À medida que os imigrantes se estabelecem nas principais cidades de Joanesburgo, Pretória, Durban e Cidade do Cabo, eles trazem consigo diferentes formas de crenças e práticas pentecostais, dando crédito ao pentecostalismo como uma religião 'feita para viajar'. Devido à aparência eclética do pentecostalismo na África, os estudiosos descrevem o movimento como pentecostalismos africanos (Kalu 2008: 5) [1], como reconhecimento das diversidades da história, cismas e crenças e práticas variadas dentro do movimento.


Ministérios de cura profética
No entanto, o que coloca essas diversas formas de pentecostalismos africanos sob o mesmo dossel é a ênfase na importância, poder e presença do Espírito Santo na vida dos seguidores. Os pentecostais também geralmente acreditam em falar em línguas, profecias, visões, curas, milagres, sinais e maravilhas. Ultimamente, tem havido um crescimento nos ministérios de cura profética ('evangelho da saúde e da riqueza') nos quais os 'neopentecostais tomam o poder de amuletos e fetiches com seriedade absoluta […] incluindo alternativas nas formas de óleo da unção, água benta, calendários ou lenços »(Kgatle 2017: 3) [2]. Tão convincentes são os pastores pentecostais que, no passado recente na África do Sul, alguns instruíram seus congregantes a se envolverem em práticas controversas, como comer grama e cobras, orar com Doom, um inseticida polivalente para curar várias doenças, beber limpador de motor, entre outros métodos de cura bizarros.

Estado nacional do desastre
Quatro dias após minha conversa com Thomas, o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, declarou um estado nacional de desastre em 16 de março, anunciando uma série de medidas para conter a disseminação de infecções por coronavírus. Uma semana depois, Ramaphosa anunciou um bloqueio de três semanas em todo o país, aumentando a resposta do país à disseminação do coronavírus. A perspectiva certamente parece sombria na maioria dos países africanos, considerando as chances de sistemas de saúde geralmente fracos, altos níveis de pobreza e desigualdade, infra-estrutura urbana pobre de água e saneamento, conflitos endêmicos e superlotação na maioria das áreas urbanas, como mercados vibrantes, espaços de transporte público assentamentos informais. As medidas de contenção são ainda mais complicadas pelas fronteiras vastamente porosas da maioria dos países vizinhos africanos que declararam proibição de viagens a não cidadãos.

"O coronavírus desaparecerá em 27 de março"
Enquanto conversávamos, alguns amigos de Thomas da igreja se juntaram a nós em sua barraca. Ronald trabalha como guarda de segurança em uma cadeia de supermercados, enquanto Tafadzwa é auxiliar geral de uma empresa de construção. "Você viu a profecia do profeta TB Josué?", ​​Perguntou Tafadzwa. Eu não tinha visto ou ouvido falar sobre a profecia. Tafadzwa explicou que o pastor nigeriano TB Joshua, líder da Igreja da Sinagoga de todas as Nações (SCOAN), 'profetizou' que o coronavírus desapareceria em 27 de março. Isso não fazia sentido para mim, pois o COVID-19 estava ganhando impulso na África, com mais casos relatados em todo o continente. De fato, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, instou a África a 'se preparar para o pior', à medida que o continente fica atrás da curva global para infecções e mortes por COVID-19 desde o início de janeiro de 2020. 'A África deve acordar […] em em outros países, vimos como o vírus realmente acelera após um certo ponto de inflexão '.

A mensagem de um pastor no WhatsApp
Ronald entra na conversa e declara que seu pastor diz que o COVID-19 é uma maldição, pois as pessoas falharam em obedecer a Deus. Ele pega o telefone e nos mostra uma mensagem do WhatsApp compartilhada por seu pastor que diz:

O coronavírus é uma maldição de Deus porque falhamos em obedecê-Lo? Vejamos esses versículos da Bíblia - Levítico 26 vs 14-16; Deuteronômio 28 vs 15 e 22; e Isaías 26 vs 20 - 21. Vamos estar em uma atitude de arrependimento, pois é isso que acalmará tudo na terra. Deus está procurando um coração arrependido. Um coração que clama por Sua misericórdia, um coração que implora por Seu perdão, um coração que está pronto para se arrepender e deixar sua vida passada. Vamos clamar por arrependimento. Vamos colocar dores e usar sacos e chorar diante dEle enquanto nos arrependemos. Deus está procurando um coração arrependido !!! Vamos nos arrepender! [Mensagem de 06 de março de 2020].

Desde que a OMS declarou o COVID-19 uma pandemia global em 11 de março, as mídias sociais foram inundadas com 'vozes pentecostais' cuja narrativa conceitua e descreve o COVID-19 como uma 'maldição' ou cumprimento de uma 'profecia' por multidões de 'homens de Deus'. De um modo geral, esses são temas comuns no movimento pentecostal, embora às vezes discordem das mensagens de saúde pública, pois alguns pastores incentivam os seguidores a 'se arrependerem' e orarem contra a 'pestilência' do COVID-19, com pouca consideração por promover medidas como isolamento e distanciamento social.

Igreja sem paredes
À medida que os casos continuam aumentando, um profeta pentecostal em Joanesburgo convocou uma cadeia de oração de vinte e um dias (24/7) contra a 'maldição do coronavírus em nossa nação e na África em geral'. Com mais de 400 congregantes predominantemente imigrantes, as orações em cadeia coincidem com os 21 dias de bloqueio em todo o país. A socialidade pentecostal foi consolidada em plataformas virtuais onde os membros se envolvem. Alguns a apelidaram de "igreja sem paredes", pois os membros se encontram e interagem virtualmente.

Realidade desafiante
Ao me separar de Thomas e de seus dois amigos, percebo que é preciso fazer mais para educar e sensibilizar comunidades de fé, como os cristãos pentecostais, para aumentar seu conhecimento.

- tradução provisória de:
https://www.ascleiden.nl/content/ascl-blogs/virus-curse-or-prophecy-african-pentecostals-making-sense-covid-19-pandemic

Covid-19: África suplica a Deus pelo fim da pandemia

Bandeira da União Africana


- CONSELHO DE IGREJAS CRISTÃS EM ANGOLA - CICA

A Plataforma e Diálogo Inter-religiosa em África - uma plataforma da União Africana (UA) - convidou para Sexta-feira, 22 de Maio, os cristãos a suplicar a Deus dedicando um tempo de oração pelo fim da pandemia do coronavírus a nível do nosso continente.
O apelo foi tornado público pela Reverenda Deolinda Dorcas Teca, Secretária Geral do CICA e membro desta plataforma ligada a União Africana, organização internacional que promove a integração entre os países do continente nos mais diferentes aspectos.
“A plataforma achou por bem partilhar essa iniciativa com os demais irmãos a nível de África e do mundo para uma oração colectiva sobre a questão da Covid-19”, referiu a pastora.
Para ela, a Covid-19 é uma pandemia que tem estado a afectar a vida humana. Ela rompe fronteiras nacionais, regionais e internacionais. “Não escolhe raça, sexo, religião e nem classe política e social”, sublinha ainda.
A líder ecuménica disse também a pandemia constitui uma ameaça e todos sentem na vida lamentando pelo facto da mesma ter trazido a humanidade sofrimento humano, tanto na perspectiva económica e social.
A Reverenda pediu que os cristãos orem a favor dos que sofrem, os que perderam suas vidas preciosas, pelos profissionais de saúde, mulheres que não estão seguras durante o confinamento sobre violência doméstica, governantes, entre outros aspectos.
“Africa orando, junta e unida para o fim da pandemia” é o tema que  direciona a oração continental da luta contra o coronavírus.


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África promove jornada inter-religiosa pelo fim da pandemia

Addis Abeba - O Fórum para o Diálogo Inter-religioso da União Africana (IFDF, na sigla em inglês) apelou às populações para que se juntem, sexta-feira, numa jornada de oração pelo fim da pandemia de Covid-19.
"Apelamos a todas as pessoas de fé e boa vontade que se juntem numa oração pelo fim da pandemia", apelou o IFDF numa mensagem dirigida a todas as religiões e crentes do continente.

A organização instituiu sexta-feira como o 'Africa Prayer Day' e pede para que seja observado em "todos os países do continente".

Os responsáveis do organismo, que integra 11 líderes religiosos de todas as regiões africanas, assinalam que a pandemia afectou as comunidades religiosas de várias formas, levando ao cancelamento de missas, peregrinações e festividades religiosas e obrigando ao fecho de mesquitas, igrejas, sinagogas e templos.

Apelando para a unidade e solidariedade, o fórum enalteceu a resposta de "centenas de líderes religiosos, suas instituições e voluntários" na mitigação das situações de fome, violência, traumas e stress causados pelo confinamento prolongado e pelas medidas de luta contra o novo coronavírus.

Além do fim da pandemia, apela-se às populações que rezem pela recuperação dos infectados com o novo coronavírus, pelas vítimas mortais, pelos profissionais de saúde e todos os trabalhadores dos serviços essenciais e pelas mulheres vítimas de violência doméstica.

"Rezaremos juntos, na luta contra a propagação da Covid-19, pelo rápido fim da pandemia e pela descoberta de curas e tratamentos. Encorajamos os esforços e as inovações dos investigadores, engenheiros e médicos africanos na sua tentativa de desenvolver curas e tratamentos que reflictam as nossas tradições e valores", refere a mensagem.

O IFDF é uma plataforma da União Africana (UA) que promove a cooperação e o diálogo entre diferentes religiões, explorando o poder das comunidades religiosas para progredir nas áreas da justiça, paz e segurança em África.

Criado em 2016, é gerido por uma comissão eleita pelos conselhos inter-religiosos dos Estados-membros da UA.

A actual comissão do IFDF é composta por 11 membros, dois por cada região africana e um em representação dos jovens.

O islamismo e o cristianismo são as maiores religiões em África, convivendo no continente com várias crenças tradicionais.
https://m.portalangop.co.ao/angola/pt_pt/noticias/africa/2020/4/21/Africa-promove-jornada-inter-religiosa-pelo-fim-pandemia,2a3dd661-23f5-4780-8e59-6315e762fe19.html

MANIFESTO DO GRUPO AFRICANIDADES




- NEGROS NO BRASIL E NEGROS NA ÁFRICA: COMO A PANDEMIA NOS ATINGE?



Enquanto diversos países da África tornaram-se exemplo no combate à pandemia, a exemplo dos lockdown de sucesso no Senegal e na África do Sul e dos robôs enfermeiros de Ruanda, o destino dos negros descendentes dos africanos escravizados na América e na Europa tem sido decidido pelo histórico de racismo, segregação, empobrecimento e fragilização da população preta, escancarando as desigualdades sociais.

No Brasil, esse desastre já tinha sido anunciado pela primeira morte do Rio de Janeiro: moradora de Miguel Pereira, a faxineira Cleonice Gonçalves contraiu o vírus da empregadora, moradora do Leblon que havia retornado de uma viagem à Itália. Sem ter sido avisada do risco de contágio, Cleonice não recebeu o atendimento adequado e morreu no dia 17 de março.

Cleonice trabalhava em limpeza, um dos serviços considerados essenciais assim como agricultura, distribuição de alimentos, construção civil, transporte, vigilância e call center. Mas quem são as trabalhadoras e trabalhadores desses serviços? Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego, 72% dos trabalhadores de limpeza são pretos, assim como 60% dos serventes de pedreiro, 70% dos vigilantes e seguranças e 75% dos atendentes de telemarketing. Para grande parte desses trabalhadores, isolamento social não é uma opção.

Apesar de representarem 54% da população, a população preta são 76% dos moradores de favelas, ocupando casas pequenas, mal arejadas e superlotadas, onde não é possível realizar o isolamento, nem mesmo das pessoas doentes. Até mesmo as máscaras, itens básicos de segurança recomendados pela Organização Mundial da Saúde, Ministério e Secretarias, causam problemas de segurança durante as abordagens policiais.

A distribuição desigual das oportunidades no mercado de trabalho reflete na remuneração e nas condições de vida, de habitação e de acesso à saúde dos pretos, e a COVID-19 e suas implicações só acirraram tal situação.

Mais do que nunca, a saída é comum e é comunitária. Enquanto na terra de nossos ancestrais se recorre aos séculos de conhecimentos e de laços para proteger o povo negro, fora dela, são os negros o primeiro alvo da calamidade pública. Lá ou aqui, é nestes laços e nesta ciência que encontraremos o caminho a seguir. Por hora, sairmos vivos da pandemia, proteger os nossos e a nossa comunidade é a nossa maior demonstração de resistência neste cenário. Nossa vitória não será por acidente!

RESISTIR! ONTEM, HOJE E SEMPRE!


A PASSAGEM

Viemos do pó da terra
Meteram-nos nessa guerra
Brigando por terras que nunca foram nossas
Nem vossas.

Somos eternos imigrantes
Peregrinos no meio de gigantes
Distantes em uma realidade
Sem idade, que enfrenta tempestades.

Nos metem vaidades
De propriedades imaginárias
Destruindo tudo de bom
Que nossa terra nos deu.

Júlio Silva, 2020.

ELEMENTO TERRA

Nascida do elemento terra: sou ventre;
Mulher motriz, força geradora: sou parto;
Abro meus olhos de luzes: sou vidas;
Crescida substância, pétala sobre pétala: sou negra;
Feminina matriz, trago, da água, o sagrado: sou raiz;
Floresço o mundo em arvoredos: sou África!

Benê Lopes, 2018.



ARTE GRÁFICA: Del Nunes (@uendelns).

ÁFRICA E O CORONAVÍRUS: https://www.brasildefators.com.br/2020/04/17/como-a-africa-esta-enfrentando-o-coronavirus
LOCKDOWN NO SENEGAL: https://www.institutmontaigne.org/en/blog/coronavirus-and-africa-senegal-communication-and-prevention-are-key-words
ROBÔS ENFERMEIROS DE RUANDA: https://face2faceafrica.com/article/coronavirus-rwanda-introducing-robots-in-treatment-centers-other-public-places
CLEONICE GONÇALVES, PRIMEIRA MORTE DO RIO: https://apublica.org/2020/03/primeira-morte-do-rio-por-coronavirus-domestica-nao-foi-informada-de-risco-de-contagio-pela-patroa/
BRANCOS E PRETOS NO MERCADO DE TRABALHO: https://contec.org.br/brancos-sao-maioria-em-empregos-de-elite-e-negros-ocupam-vagas-sem-qualificacao/
A COR DA POBREZA NO BRASIL: https://www.techo.org/brasil/informe-se/a-pobreza-brasileira-tem-cor-e-e-preta/
USO DE MÁSCARAS NA PERIFERIA: https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2020/04/07/coronavirus-racismo-impede-que-alguns-negros-usem-mascaras-feitas-em-casa.htm


Dá-me de beber (água): o desafio da mulher africana em tempos de COVID-19 – Fica em casa


- Reflexão da Revda. Dra Elvira Moisés Cazombo - 


Introdução
“Mais do que uma questão de falta de infra-estruturas, e a semelhança do que acontece com o saneamento básico na cidade capital, o problema da água reside precisamente na forma de como os projectos são concebidos e executados”[1]. O lado desafiador da mulher em tempos de confinamento passa pelo grito por água. A ausência da água potável nas residências da maioria das famílias denuncia a fragilidade das politicas públicas e aponta para as práticas de injustiças acentuando a desigualdade de gênero. Pois, sempre foi costumeiro a manutenção de água nas residências familiares ser de responsabilidade do gênero feminino.
Citando a mesma fonte “o engenheiro Francisco dos Santos disse que, além das graves debilidades registadas na elaboração e execução desses projectos {água para todos}, houve também ausência de algum sentido de Estado e de patriotismo, a volta das pessoas que estiveram a frente destas operações”[2]

“Dá-me dessa água, para que eu não tenha mais sede nem precise vir aqui.”
A Bíblia registra vários relatos aonde a água é concebida como bem maior e um direito inalienável, vejamos:
Em Gêneses capítulo 1 o narrador descreve que Deus ordenou a construção das estruturas cósmicas dando o formato tanto para os céus quanto para a terra (v.1), a definição da iluminação e diferenciação dos períodos (v,2-5), a construção do firmamento no meio das águas, o separador entre as águas dando o formato do cosmo ( v.6-7) e definindo os dias entre primeiro e segundo dias. Este ordenamento foi para quebrar o caos, formatar o vazio e criar a coesão, a estrutura física da terra. Nesta cosmovisão o Espirito de Deus pairava sobre as águas. As águas foram usadas como separadores entre águas e águas (Gn 1: 6), águas debaixo do firmamento e águas em cima do firmamento dando origem ao céu. Pelo olhar do narrador bíblico, o céu é uma estrutura construída sobre forças das águas. 
Já para a estrutura terrestre, Deus disse: “juntem-se as águas que estão debaixo dos céus num só lugar e apareça a porção seca” (v.9). A partir daí o ser humano, feito a imagem e semelhança de Deus evoluiu sabendo que a água é parte integrante da vida, do bem estar total (Shalom), assim como a representação dos céus (habitação de Deus (?). A permanência dos seres viventes no jardim de Éden foi permeada também pela água, sendo que não é possível a haver jardins e plantas sem a água.
No Livro de Êxodo, o processo de libertação do povo no Egito da mão dos algozes faraónicos, a água foi de igual modo evidenciado como espaço de mediação. Na passagem pelo mar vermelho Deus ordenou a Moises para estender a vara que estava em sua posse sobre o mar e dividi-lo para os filhos de Israel passarem pelo meio dele em seco (sem água). Assim procedeu Moises e os filhos de Israel caminharam sobre a terra seca. As águas lhes foram qual muro a sua direita e a sua esquerda (Ex.14:22) de maneiras que nenhum israelita pereceu no meio do mar. O Deus da criação usa de igual modo a água para proteger os seus filhos libertando-os da escravidão para uma terra que mana leite e mel, longe do sofrimento e das injustiças sociais.
O olhar de Deus da criação que aparece no Egito para libertar é o mesmo que se manifesta em Samaria para salvar. 
No Evangelho Joanino Deus intervém na história da salvação através de seu filho Jesus Cristo. Na trama apresentado por João descreve essa presença de Deus. Veja: perto do meio dia (a hora sexta) uma mulher da Samaria chegou para tirar água. Jesus lhe disse: “dá-me de beber!” diz-lhe a Samaritana: “Como, sendo judeu, tu me pedes de beber, a mim que sou samaritana?” Jesus respondeu-lhe: “se conheceras o dom de Deus, e quem é o que te pede: Dá-me de beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva.” Disse-lhe a mulher: Senhor tu não tens com que tirá-la, e o poço é fundo (João 4.6-16). A resposta da mulher que o poço é fundo e Jesus (masculino) não pode tirar, resulta em indignação por parte de Jesus e sutilmente ela denuncia a visão tradicional que “a fonte é das mulheres”, espaço socialmente definido como sendo de domínio delas. Por isso somente ela pode manusear a retirada da água. A indignação de Jesus oferece uma nova perspectiva de oportunidade para a liberdade de escolha: “a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água que jorra para toda vida” (v.14b). “Senhor, dá-me dessa água para que eu não mais tenha sede, nem precise vir aqui tira-la (v.15)
Esse diálogo entre Jesus e a mulher desafiam as tradições pois um judeu não poderia dirigir a sua palavra a um samaritano, nem tampouco um homem poderia falar com uma mulher em público (especialmente no caso de Jesus que era considerado um Rabi). A samaritana estava consciente de que a atitude daquele judeu era estranha e incomum por dois motivos: por ela ser samaritana e ser mulher, assim como a quebra das tradições que definem as tarefas socialmente estabelecidas que somente as mulheres devem executa-las.   
Na visão de Jesus a água só tem importância quando ela está a serviço da promoção da vida. Ela é inesgotável por isso afirma: “Quem crê em mim, como diz as Escrituras, do seu interior fluirão rios de água viva” (7.38). A água não se restringe como benefício apenas de uns em detrimento de outros, mas para todos que queiram beber. Ele se dispõe para saciar a sede tal como o firmamento sustenta os céus da terra assim é a água para com a vida humana. Então por que haver “torneiras para todos, mas não há água para ninguém”? A resposta deste questionamento deixa de ser teológica e aponta para o campo das políticas públicas que definem o que é prioritário e o que não é essencial na vida das pessoas.




“Torneiras para todos, mas não há água para ninguém”[3].
 Nas agendas das prioridades do governo quanto ao “Direito do Ambiente, o artigo 39º da Constituição da República de Angola estabelece que, todos têm direito à água e à vida num ambiente sadio e não poluído, cabendo a todos a obrigação de o defender e preservar.
Tal artigo reconhece o acesso à água e ao saneamento básico como direitos humanos fundamentais para o desenvolvimento sustentável, e a consequente redução da pobreza, como vem consagrado na Resolução 64/292, de 28 de Julho de 2010, das Nações Unidas.”[4]
O campo intrigante para a maioria dos países africanos está no quesito, água, “água para todos”. O continente é geograficamente ladeado de oceanos atlântico e indico. Rico em recursos hídricos citando como exemplo os rios de grandes afluentes Nilo e Zambezes, onde em cada país pode ser encontrado a particularidade de ter um pouco mais em relação ao outro. Seja como for a dimensão hidrográfica gigantesca do continente não justifica a falta de água potável para todos.
“De acordo com relatos da imprensa, na capital do país, a maioria da população urbana é abastecida mediante conexões públicas, partilhadas entre vizinhos, por chafarizes e camiões cisternas (esta última classificada como fonte não apropriada). Verdade ou mentira, o que acontece é que, em algumas zonas de Luanda, com realce para a localidade do Rocha Pinto, no Distrito Urbano da Samba, município de Luanda, o abastecimento de água potável continua a ser um problema e, segundo sustentam fontes do Jornal de Angola, são poucos os que conseguem dizer, com toda a certeza, até onde vai o alcance do famoso Programa “Água para Todos”, apesar de toda propaganda positivista que  se faz a volta do mesmo”. Isso denuncia que a água não é para todos, mas para um número reduzido que detém o capital financeiro. É a monopolização da água. Não há água para todos mas encontramos os supermercados comercializando águas oriundas de múltiplas fontes, dando que entender a existência de várias empresas que exploram os mananciais e os rios somando lucros desordenados. É o rosto do capitalismo expropriando aquilo que faz parte do bem comum e dividindo a sociedade em classes: Água potável para uns e as torneiras que não saem água para a maioria. Assim, se vê mulheres com cântaros na cabeça em busca de água, atravessando ruas e ruas, disputando as a travessias com carros que percorrem as estradas em altas velocidades. Muitas delas nestas disputas nem sempre o fim tem sido agradável, resultando em tragédias. Somando a estes desafios tem o paradoxo de “Fica em Casa”, é tempo de pandemia. Os membros familiares sobre sua tutela dizem: dá-me de beber! (A criança pede água para beber e o marido pede água para beber). Nestes tempos ela deveria ficar de igual modo em casa, abrir a torneira e desfrutar-se da água, concomitantemente, resguardada da possibilidade do contagio.  Porém as torneiras não saem água.
Tomando de exemplo Angola uma fonte do Jornal de Angola disse que, “nas províncias do Bengo e Cuanza-Sul mais de 90 por cento do Programa “Água para Todos” não funciona. “O mesmo foi realizado sem ter em conta a realidade objetiva do país. Não temos, em Angola, recursos humanos e materiais para pôr a funcionar os equipamentos sofisticados que o Estado comprou, no âmbito do projeto em causa”[5]. Essa justificativa distancia-se da visão profética de Deus que determina a água como um bem inalienável. Restringir o direito a água por qualquer justificativa é violar os diretos humanos, roubar a dignidade humanidade, destruir perspectivas e criar um modelo de racionalidade que tem por objetivo deixar a mulher numa condição vulnerável. Nas sociedades africanas culturalmente a água é providenciada pelas mulheres. Com essas ações administrativas ora justificativas por falta de recursos humanos ora por outras circunstancias tendem a penalizar a mulher para a violência. 
Em suma, o descaso pela falta de água é um meio discriminatório contra as mulheres e o ambiente vulnerável para as mulheres serem submetidas a violência doméstica em tempos de pandemia. Além espaço de reprodução da violência institucionalizada. Foi sobre este olhar que Jesus se aproxima a mulher samaritana para ressignificar o poço como espaço não de repreensão, mas de liberdade. A frase “torneiras para todos, mas não há água para ninguém”[6] é o grito denunciante das mulheres oprimidas que vivem a meio as injustiças sociais e a margem das políticas desseguradas e o descaso. Porém a mulher espera em dias melhores, por isso afirmam: “água tarda a chegar às torneiras”. Com as verbas dos dinheiros recebidos e a água não chega nas torneiras convertestes a justiça em alasona e deitais por terra a retidão (Amós 5.7). Por isso, “dá-me dessa água, para que eu não tenha mais sede nem precise vir aqui (neste poço), porque as torneiras são para todos, mas não há a água para ninguém, a mulher denuncia a vulnerabilidade que o poço lhe oferece para possibilitar que “corra a justiça como as águas e a retidão como ribeiros perenes. (Amós 5:24).





[1] http://jornaldeangola.sapo.ao/sociedade/agua-tarda-a-chegar-as-torneiras?fbclid=IwAR3cR9vkThPcxLxlMegw2ajUGKh9Y3ZpMlVDSG6TsiOP-3sNkTEasge1nrE
[2] Op cit
[3] Frase de uma mulher que denuncia a falta de água nas residências da maioria das famílias, segundo o jornal de Angola. http://jornaldeangola.sapo.ao/sociedade/agua-tarda-a-chegar-as-torneiras?fbclid=IwAR3cR9vkThPcxLxlMegw2ajUGKh9Y3ZpMlVDSG6TsiOP-3sNkTEasge1nrE
[4] http://jornaldeangola.sapo.ao/sociedade/agua-tarda-a-chegar-as-torneiras?fbclid=IwAR3cR9vkThPcxLxlMegw2ajUGKh9Y3ZpMlVDSG6TsiOP-3sNkTEasge1nrE

[5] http://jornaldeangola.sapo.ao/sociedade/agua-tarda-a-chegar-as-torneiras?fbclid=IwAR3cR9vkThPcxLxlMegw2ajUGKh9Y3ZpMlVDSG6TsiOP-3sNkTEasge1nrE

[6]http://jornaldeangola.sapo.ao/sociedade/agua-tarda-a-chegar-as-torneiras?fbclid=IwAR3cR9vkThPcxLxlMegw2ajUGKh9Y3ZpMlVDSG6TsiOP-3sNkTEasge1nrE