- As respostas ao COVID 19 são a ciência e as tecnologias da
saúde… mas as maiorias pobres em Angola e no Mundo recebem somente migalhas de
ciência e de saúde. Os estudos da religião e a teologia precisam ir além do
binário ciência X magia para se aproximar de um fenômeno complexo e cotidiano:
a busca pelo milagre!
Alguém já disse que:
"A exigência de que se abandonem as ilusões sobre uma
determinada situação, é a exigência de que se supere a situação que
necessita de ilusões."
São 3 grandes desafios: 1- entender a busca por milagres como
dor e desespero; 2- ao mesmo tempo confrontar agentes religiosos que se
aproveitam dessa busca e 3- contribuir com uma pastoral libertadora na criação de
coletividades de fé e de direitos.
“E é ao invisível que a linguagem
religiosa se refere ao mencionar as profundezas da alma, as
alturas dos céus, o desespero do
inferno, os fluidos e influências que curam, o paraíso, as
bem-aventuranças eternas e o
próprio Deus.” Rubem Alves
A notícia abaixo apresenta diversos relatos por curas milagrosas contra
o COVID 19 em África: material fundamental para a reflexão dos estudos da
religião e de uma teologia que tem a justiça no coração de sua tarefa e
espiritualidade.
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Chás "milagrosos" não curam Covid-19
Do chá distribuído de porta em porta em Madagáscar ao
ervanário congolês que aconselha a beber urina, as "curas milagrosas"
para a Covid-19 continuam a multiplicar-se em África. OMS avisa: não há
evidências científicas.
Imagine este cenário: está em casa, ouve bater à porta e
quando abre encontra um soldado que lhe oferece um chá de ervas contra a
Covid-19. Pode parecer estranho, mas é o que tem estado a acontecer por estes
dias em Madagáscar, depois de o próprio Presidente Andry Rajoelina ter elogiado
uma bebida desenvolvida pelo Instituto Malgaxe de Investigação Aplicada (IMRA)
a partir de artemísia, uma planta com eficácia comprovada contra a malária.
"Foram realizados testes. Duas pessoas estão agora
curadas por este tratamento", afirmou Andry Rajoelina no início desta
semana. O chefe de Estado foi ainda mais longe: "Este chá de ervas dá
resultados em sete dias [...]. Podemos mudar a história do mundo inteiro".
Na terça-feira (21.04), foi a vez de os soldados defenderem
a bebida na televisão nacional, desta vez atribuindo-lhe capacidades de
prevenção. "Não há cura direta para o coronavírus", explicou o
coronel Willy Ratovondrainy, médico do Exército. No entanto, insistiu, "a
única solução, até agora, é reforçar a imunidade. E este remédio tradicional
reforça a imunidade".
Soldados malgaxes fardados vão de porta em porta nas ruas da
capital, Antananarivo, distribuir o chá aos habitantes. Mas a eficácia deste
chá de ervas contra a Covid-19, provocada pelo novo coronavírus, não foi,
porém, objeto de qualquer estudo científico publicado.
Supostas curas podem matar
Marcel Razanamparany, da Academia de Medicina de Madagáscar,
confirma que o "medicamento" ainda tem de ser avaliado a nível
científico e mostra-se preocupado com os potenciais efeitos secundários
negativos que o chá que está a ser distribuído pelo Exército pode ter nas
pessoas que o ingerem, particularmente em crianças.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) tem vindo a sublinhar
que "não existem provas de que os medicamentos atuais possam prevenir ou
curar a doença", embora reconheça que "os remédios tradicionais [...]
podem aliviar os sintomas da Covid-19". Mas a organização alerta contra o
uso de terapias caseiras não testadas.
A medicina tradicional é altamente respeitada em África.
Muitos curandeiros, no entanto, estão a aproveitar a pandemia para venderem
"banha da cobra". Em Nampula, no norte de Moçambique, onde a
atividade dos médicos tradicionais está suspensa no âmbito do estado de
emergência, a Associação dos Médicos Tradicionais prometeu mesmo tomar medidas
contra todos os associados que se envolvam no suposto tratamento da Covid-19.
E a lista destes "supostos tratamentos" é extensa
no continente: na República Democrática do Congo (RDC), um médico tradicional
propõe uma "cura garantida" num anúncio numa rádio local:
"Inalar os vapores de uma mistura de manga e casca de árvore, folhas de
papaia e uma planta secreta". Nos Camarões, um naturopata sugere um
remédio semelhante - só mudam os ingredientes da infusão - alho ou gengibre com
extrato de menta, fervidos em água, bastarão para combater o vírus. Já um
auto-intitulado ervanário congolês sugere beber a própria urina - sem qualquer
base científica que comprove os alegados benefícios.
Entretanto, já há registo de vítimas mortais de falsas curas
tradicionais para a Covid-19 propaladas no continente. Na semana passada, a
Rádio Okapi, da ONU, noticiou a morte de três crianças na RDC depois de a mãe
ter administrado aos filhos uma planta medicinal que se acredita ser capaz de
Ciência vs. Fé
Em Madagáscar, país muito pobre do Oceano Índico, a
população, que toma regularmente remédios fitoterápicos (a partir de derivados
vegetais), acolheu de braços abertos a inesperada e gratuita distribuição do
chá de ervas 'Covid-Organics'. "Desde que vimos o Presidente Rajoelina
bebê-lo na televisão, estamos ansiosos por o levar", disse Jean-Louis
Rakotonandrasana, 58 anos, motorista de carro, depois de ter recebido sete
sacos de chá de ervas.
"Uma saqueta para quatro litros de água, a ser tomada
em dois copos por dia para um adulto e um copo para as crianças. É proibido
para as mulheres grávidas", instruem os soldados. Com a distribuição deste
remédio tradicional, as autoridades malgaxes pretendem "proteger a população
através da sensibilização contra o vírus e do reforço do seu sistema
imunitário", numa altura em que o país regista 121 casos de Covid-19.
O Centro norte-americano de Controlo e Prevenção de Doenças
tem estado a pedir vigilância para as alegadas curas tradicionais: "Não há
qualquer evidência científica de que qualquer destes remédios alternativos
possa prevenir ou curar a doença da Covid-19. Na verdade, alguns deles podem
não ser seguros para consumo".
Ainda assim, enquanto a comunidade médica internacional
continua em busca de um tratamento e vacina eficazes, a procura continua em
alta, numa combinação de desespero e fé na medicina tradicional. Segundo a
Organização Mundial de Saúde, há "vários ensaios clínicos em curso"
tanto de medicamentos ocidentais como tradicionais. E curandeiros em vários
países africanos exigem ser tidos em conta pelas autoridades de saúde na
procura de uma solução, uma vez que a medicina convenvional ainda não foi capaz
de o fazer.
Nos Camarões, o diretor de controlo de doenças do Ministério
da Saúde, Georges Etoundi Mballa, garante que a porta não está fechada à
participação da medicina tradicional: "Estamos abertos. Nada está
excluído. Todos aqueles que consigam providenciar uma resposta científica,
incluindo médicos tradicionais, são bem-vindos". Na África do Sul, o
porta-voz do Ministério da Saúde diz que o departamento recebe cerca de 10
chamadas por dia de pessoas que alegam ter a cura para a Covid-19. O Governo
reconhece o papel dos curandeiros, diz Pop Maja: "Respeitamos o seu papel
[...] mas para já não há cura, sabemos que não há cura para o
coronavírus".
http://tpa.sapo.ao/noticias/internacional/chas-milagrosos-nao-curam-covid-19
Citações de: O que é Religião – Rubem Alves

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