domingo, 17 de maio de 2020

Em tempo de tribulação: a relação Estado e Igreja


O direito internacional dos direitos humanos, em particular o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP), exige que as restrições aos direitos por razões de saúde pública ou emergência nacional sejam legais, necessárias e proporcionais. https://www.hrw.org/pt/news/2020/03/23/339866

Em Angola – como em muitos países - o estado de emergência restringe as atividades de Igrejas. Pedimos a um especialista de direito e teologia que comentasse a situação em Angola na perspectiva jurídica.


- comentário do Prof. Dr. Nelson Domingos António - Graduado em Teologia, Direito e Filosofia. Mestre em Filosofia. Doutor em Ciência Política; colaborador do Programa de Pós Graduação em Estudos da Religião e Teologia da Metodista de Angola


O artigo 27.⁰ do Decreto Presidencial n.⁰ 128/20, de 8 de Maio, que Prorroga o Estado de Emergência, manteve a suspensão dos cultos e celebrações colectivas em todos os lugares cúlticos, assegurando, no entanto, a liberdade de culto em sua dimensão individual. O Decreto supracitado prevê a responsabilização da confissão religiosa que violar o disposto neste diploma legal, mediante a suspensão do seu reconhecimento por um período de até um ano.

A consagração da referida suspensão decorre da inobservância reiterada do Estado de Emergência por parte de alguns fiéis e líderes religiosos que têm procurado, à margem da lei, realizar cultos e celebrações colectivas, aumentando o risco de propagação do novo Corona Vírus. Este fenómeno coloca o conflito entre a liberdade religiosa em sua dimensão colectiva e o dever de observância dos ditames legais para evitar o contágio e assegurar a preservação da vida humana.

A Constituição enquanto Lei Magna do Estado angolano, em seu artigo 10.⁰, n.⁰ 2, consagra o reconhecimento e o respeito às diferentes confissões religiosas, bem como o direito à liberdade de organização e ao exercício das suas actividades, desde que as mesmas se conformem à Constituição e às leis da República de Angola. Entretanto, este direito pode ser limitado em caso de declaração de Estado de Exceção (Estado de Sítio, Estado de Guerra, Estado de Emergência).

O Estado de Emergência é uma modalidade de Estado de Exceção que se caracteriza pela suspensão ou limitação temporária de certos direitos, liberdades e garantias, diante de situações de calamidade pública, catástrofes naturais e epidemias, em parte ou em todo o território nacional, nos termos do artigo 58.º, n.º 1, da Constituição da República de Angola de 2010 (CRA/2010) e do artigo 4.º da Lei sobre o Estado de Sítio e Estado de Emergência (Lei n.º 17/91, de 11 de Maio de 1991).

A limitação estatuída no artigo 27.⁰ do Decreto Presidencial n.⁰ 128/20, de 8 de Maio, refere-se apenas à dimensão colectiva, salvaguardando a dimensão individual. Assim, a meditação individual e os cultos domésticos são oportunidades para testemunhar e fortalecer a fé e a comunhão no lar. Urge rememorar que em tempo de tribulação, sobretudo, os cultos e celebrações em pequenos grupos nos lares constituem características da Igreja de Cristo.

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>> as notícias: 

1- Igrejas que realizarem cultos durante o estado de emergência vão perder a licença 
http://www.novojornal.co.ao/sociedade/interior/covid-19-igrejas-que-realizarem-cultos-durante-o-estado-de-emergencia-vao-perder-a-licenca-87822.html?fbclid=IwAR153PgI60JTfRe9KlbCDUXhMEK6r2TVfamKK9i36oWdYibIQuxRmk3jqIw

2- COVID-19: Pastores condenados por desobediência

Dundo - Dois pastores da Igreja Assembleia de Deus Pentecostal e igual número de diáconos da Igreja Adventista do Sétimo Dia, no município do Cuango (Lunda Norte), foram condenados, segunda-feira, a três meses de prisão, com penas suspensas.
http://www.angop.ao/angola/pt_pt/noticias/sociedade/2020/3/15/COVID-Pastores-condenados-por-desobediencia,410da5ff-b4a4-4616-8a76-06c03a178114.html

3- No Namibe foi detido um pastor da igreja Missão Evangélica Espírito Santo, enquanto na Huíla foram detidos sete pastores que se dedicavam a um culto numa residência, "colocando em risco o pastor e a sua família".
Em Saurimo, foram detidos um secretário e um administrador de uma igreja que estavam também a realizar um culto numa casa e, no Cuanza Sul, dois pastores e dois fiéis da igreja Evangélica Congregacional, também numa prática religiosa doméstica.
https://www.noticiasaominuto.com/mundo/1451523/covid-19-desobediencia-leva-a-337-detencoes-em-24-horas-em-angola

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